segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

POESIA - António Aleixo



               A Torpe Sociedade onde Nasci 


Ao ver um garotito esfarrapado
Brincando numa rua da cidade,
Senti a nostalgia do passado,
Pensando que já fui daquela idade.

II

Que feliz eu era então e que alegria...
Que loucura a brincar, santo delírio!...
Embora fosse mártir, não sabia
Que o mundo me criava p'ra o martírio!

III

Já quando um homenzinho, é que senti
O dilema terrível que me impôs
A torpe sociedade onde nasci:
— De ser vítima humilde ou ser algoz...

IV

E agora é o acaso quem me guia.
Sem esperança, sem um fim, sem uma fé,
Sou tudo: mas não sou o que seria
Se o mundo fosse bom — como não é!

V

Tuberculoso!... Mas que triste sorte!
Podia suicidar-me, mas não quero
Que o mundo diga que me desespero
E que me mato por ter medo à morte...

António Aleixo, in "Este Livro que Vos Deixo..."

2 comentários:

  1. Também disse:

    Sei que pareço ladrão,
    Mas há muitos que eu conheço
    Que sem parecer o que são
    São aquilo que eu pareço!

    Mais nada!
    António Aleixo intemporal!

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  2. Acho uma moral ruim
    trazer o vulgo enganado:
    mandarem fazer assim
    e eles fazerem assado.

    Sou um dos membros malditos
    dessa falsa sociedade
    que, baseada nos mitos,
    pode roubar à vontade.

    Esses por quem não te interessas
    produzem quanto consomes:
    vivem das tuas promessas
    ganhando o pão que tu comes.

    Não me dêem mais desgostos
    porque sei raciocinar...
    Só os burros estão dispostos
    a sofrer sem protestar!

    Esta mascarada enorme
    com que o mundo nos aldraba,
    dura enquanto o povo dorme,
    quando ele acordar, acaba.

    António Aleixo

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